Paleta de Cor para que Te Quero – Moonlight, Grandes Olhos e o Significado das Cores no Cinema
As cores influenciam tudo ao nosso redor, mas muitas vezes nem as notamos. Que tal mergulhar um pouco em seus efeitos com base em algumas produções cinematográficas?
Assistir filmes é conhecer uma história por meio de imagens, mergulhando em narrativas produzidas para conter ideias e sentimentos, sendo uma visão estética da realidade e não tendo obrigação de ser realista.
Para a psicóloga e terapeuta Bárbara Pina, o cinema é uma experiência única porque ajuda a mostrar outras formas de conhecer o ambiente em que estamos inseridos. Em suas palavras: ’
“Ler e se reconhecer no mundo, de uma maneira crítica, reflexiva, criativa, porque a grande função da arte é essa, transmutar a lógica e produzir pensamento, informação a partir da criatividade. Essa outra linguagem é importante porque a gente se reconhece muito, no que a gente vê e escuta. Acho que a arte é isso: você se reconhecer de uma forma.’’
Priscila Noronha, formada em Audiovisual, trabalha atualmente com E-commerce, mas não esconde seu carinho por filmes, além de ressaltar a importância das cores nas produções:
‘’Para uma obra audiovisual sair do papel e criar forma, é preciso alguns elementos que transportem o espectador àquele ambiente. Dentro do conceito que define a identidade visual necessária para que isso aconteça, é definido um conjunto de cores que é trabalhado em todo o segmento da obra, desde cenário, iluminação e até figurino. Isso é o que chamamos de paleta de cores. O espectador pode não reparar, mas cada cor foi pensada detalhadamente de acordo com o cenário, personagem e emoções que queiram passar em cada frame do filme.”
Uma Thurman em Kill Bill, do diretor Quentin Tarantino
A tela é capaz de transmitir inúmeras emoções e climas – como a raiva, por exemplo, presente em produções do diretor Quentin Tarantino, em que todo figurino se choca com o cenário cheio de sangue; ou a doçura trazida por cores primárias, sofisticadas e contrastes, que encantaram o público do vencedor do Oscar 2016, Moonlight – Sob a Luz do Luar, de Berry Jenkins.
“Sob a luz do luar, garotos negros ficam azuis. Você está azul. Então vou te chamar assim. Azul”
Moonlight, falando de forma “técnica”, tem um roteiro bem estruturado, que dá a chance de compreender cada fase da vida de Chiron – um garoto negro, homossexual e morador da periferia de Miami, que possui uma mãe viciada e é criado por um traficante e sua esposa. A história de Chiron, contada em três fases, não apenas se divide em três etapas de sua vida (infância, adolescência e vida adulta) como se compõe também na coerente mudança de texturas e no peso que as cores vão assumindo ao longo da projeção. (Se você ainda não assistiu, por favor, acesse já o Netflix ou qualquer outro serviço de streaming).
Particularmente fiquei muito emocionada com o fato de o filme ter mostrado a vida afetiva do protagonista de uma forma tão delicada, simples e humana – algo que costuma ficar de fora em produções com personagens negros, frequentemente marginalizados e tidos como seres bestiais.
Fotografado por James Laxton, colorido por Alex Bickel e com Hannah Beachler como responsável pelo design e direção artística (para quem não sabe, a designer também produziu toda a parte artística do álbum Lemonade, de Beyoncé), o filme de Jenkins estabelece já em seu primeiro plano uma tensão visual que será predominante durante toda a narrativa. Com um elenco predominantemente negro e latino, as cores pulsam e transmitem todos os sentimentos não ditos, assim como preenchem os olhos de quem assiste.
Os Olhos Grandes de Tim Burton
Falando sobre o mundo exótico e cheio de cores de Tim Burton, o filme ‘’Grandes Olhos’’ se passa entre o final dos anos 50 e início dos 60 e utiliza tonalidades fortes e sombrias (a cara do Tim) para contar uma história emocionante e real.
A produção é sobre o pintor Walter Keane (Christoph Waltz), que conquistou o sucesso ao comercializar pinturas enigmáticas de crianças com olhos grandes. Ao longo do filme, a verdade bizarra de que sua esposa, Margaret (Amy Adams), é quem produzia os quadros é revelada junto de abusos, loucura e redenção da personagem, em tempos onde mulheres eram ensinadas a obedecer os seus parceiros.
Tim Burton deixou os excessos de lado para encarar uma trama mais próxima da realidade. Muitas mulheres ainda são silenciadas como Margareth e o campo artístico, assim como outros, ainda é um espaço predominantemente masculino e hétero, em que muitas mulheres ainda são objetificadas e silenciadas. Burton, em sua entrevista para o Nottingham Post falou sobre o choque que sentiu ao descobrir que as autorias dos quadros não eram de Walter:
“Cresci vendo as pinturas onipresentes penduradas em salas de estar das pessoas e em consultórios médicos no subúrbio de Los Angeles. Havia algo sobre eles que eu achava interessante e perturbador. Eles me deixavam gelados. Mas, assim como todo mundo, eu acreditava que Walter era o autor daquelas imagens. Foi um choque quando se espalhou a notícia de que era Margaret quem pintava”.
Margareth possuía talento, beleza e ingenuidade, o que não apagou sua forma genial e assombrosa de ver o mundo, levando em conta todos os problemas que os E.U.A enfrentavam naquela época, como Direitos Civis dos negros. Ter alguém como Margaret era como uma inspiração de que sua arte transparecia não só sua dor, mas também sua esperança, traduzida em grandes olhos – ora curiosos, ora assustados.
Que tal um desafio?
Quero saber o que você pensa ao visualizar essa imagem acima. Dor, desafio, tensão, prazer ou tristeza?
A cor vermelha está ligada a emoções fortes, excitação e até mesmo a tensão. Nessa cena em especial, a fotografia estabelece uma separação muito clara, que logo de cara, para quem olha com atenção, nos mostra que Walter é o vilão da trama e Margaret é a vítima injustiçada. Mas por que ela? Observe que as cores estão dando juízo de valores. Enquanto Walter está sob tonalidades escuras e fortes, sua esposa se encontra mergulhada em branco, preto (pela obscuridade de sua vida naquele momento) e verde, que simboliza esperança e liberdade (desejo de produzir sua arte de forma autônoma, sem abuso) – algo que revela não só um figurino e cenário impecáveis, como os acertos de Tim Burton em sua arte.
Margaret expondo seus quadros antes de conhecer Walter.
Antes de entrar em um relacionamento abusivo, as cenas que mostram Margaret tentando levar a vida por meio da sua arte são de tonalidades claras, que combinam com seu cabelo louro, simbolizando ingenuidade e até mesmo sensualidade, algo que despertou o interesse do charlatão Walter.
Cores na palma da sua mão
Já pensou que louco entrar no Twitter e ver detalhadamente a paleta de cores do seu filme preferido, e ainda poder pedir para ver aquele que você adora? Pois o usuário @CINEMAPALLETES mostra cenas icônicas de centenas de filmes e já está no coração de muitos designers, profissionais do audiovisual e simpatizantes, como eu.
Angelina Jolie em Malévola.
Já a Colormind é uma plataforma que usa inteligência artificial para obter a paleta de cores de um infinito de mídias. Nela, você só precisa fazer o upload de uma imagem cuja paleta você quer captar e o programa vai processar e informar até cinco das principais tonalidades ali presentes. E não precisa ficar preso com filmes! Você pode fazer o mesmo com fotografias e imagens.
O site Tecnomundo fez um teste com o álbum do Sepultura
Abaixo você pode conferir um vídeo que mostra obras que deram um show e mostra claramente a importância da paleta + psicologia aplicada no cinema para atrair telespectadores e influenciar em suas emoções:
Já no vídeo Segredos do Cinema é apresentado as estratégias das produções para estimular as sensações:
Fontes:
- Designerd: https://www.designerd.com.br/cenas-de-filmes-famosos-e-suas-paletas-de-cores/
- Nexo Jornal: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/05/27/Como-as-paletas-de-cores-determinam-o-clima-dos-filmes
- obvious: http://obviousmag.org/cafe_contemporaneo/2017/moonlight—as-cores-da-solidao-sob-a-luz-do-luar.html#ixzz4voCMENbP
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