A Gordofobia em Nós – Do Comentário Aparentemente Inofensivo até as Telas do Cinema
A maioria de nós acredita que é impossível ser bonita e saudável sem ser magra.
Faz algum tempo que o tema Gordofobia vem habitando minha vontade de escrever. Na verdade, ele nunca esteve distante de mim já que, como uma pessoa gorda eu sempre tive que lidar com os comentários e olhares das pessoas que me julgavam em todas as esferas (de família e amigos, até estranhos na rua).
“Ah, Maiara, mas você não é gorda, imagina, é até bonita!”
Em primeiro lugar, ser bonita não tem nada a ver com ser gorda ou não. Essa é uma ideia que injetam na nossa cabeça desde muito cedo para aniquilar nossa auto-estima e para vender produtos nessa ditadura da beleza magra na qual vivemos.
O entretenimento e a mídia reforçam essa lógica diariamente, fazendo com que, cedo ou tarde, passemos a acreditar ser impossível ser bonita sem ser magra. No filme Nunca Fui Beijada, por exemplo, uma das ‘meninas más’ chega a sentir inveja de um esqueleto.
Certo, é isso. Só água e laxante até a formatura.
“Ah claro, pessoas gordas podem ser bonitas, mas é que você não é gorda”
Em muitos contextos sei que sou vista como uma pessoa gorda. Uma reflexão que tenho feito é que eu talvez esteja em um lugar de passagem. Não sou e nunca serei magra, mas não chego a ser gorda como outras pessoas que sofrem muito mais com a discriminação e a violência do que eu. Mesmo assim, ouvi ofensas e comentários gordofóbicos a vida inteira. Uma discussão muito bacana sobre isso está no vídeo “Nem gorda, nem magra” do Canal das Bee com a participação da Hel Mother (se não viram esse vídeo, assistam!).
O importante é que hoje eu entendo que sempre serei assim e TUDO BEM.
‘Grande e no comando, como posso te ajudar?’
“Ah, mas não é Gordofobia, é só uma questão de saúde! Estamos preocupadas com você.”
Vamos lá: ser gordo não é igual a ser doente. Precisamos parar de fazer essa associação grosseira. Muita gente magra se alimenta mal, não se exercita, tem problemas sérios de saúde e ninguém fala nada. Poucos apontam o amiguinho por estar bebendo demais, fumando demais, comendo pouco ou por ser sedentário. Mas basta ver uma pessoa gorda comendo que começa o julgamento. Ah… os fiscais de prato! Cuidado, eles estão por todas as partes.
Além das pessoas comuns, a gordofobia também é reforçada pela medicina moderna. Todas as vezes que entrei num consultório médico na vida, de ortopedista à otorrino, ouvi que precisava perder peso. Mesmo antes de fazer qualquer exame que comprovasse alguma irregularidade com a minha saúde. Ouvi também de professores de Educação Física que eu precisava emagrecer para ter um melhor desempenho. Mesmo assim, sempre fui bem nos esportes, contrariando o que me diziam ser possível.
Então que tal sermos sinceros? A maioria das pessoas odeia os gordos, principalmente as mulheres gordas. E é claro que seria mesmo pior para mulheres, já que a cobrança sobre nós, especialmente em relação a aparência, é sempre maior. A busca da ‘perfeição’ estética faz parte de uma lógica que coloca os corpos das mulheres como objetos para apreciação masculina, o que, além de tudo, heteronormatiza as nossas relações.
Me vem à cabeça neste momento aquele filme descabido chamado ‘O Amor é Cego’, no qual Jack Black é consagrado como herói por escolher ficar com uma mulher, mesmo ela sendo gorda.
Lembrando que ele só se interessa por ela inicialmente porque está enfeitiçado para ver apenas a beleza interior das pessoas, o que por si só já é um problema.
Essa história representa muito bem alguns aspectos importantes da gordofobia. Primeiro: mesmo o personagem do Jack sendo gordo, ele só se relaciona com mulheres magras. Porque um homem ser gordo é aceitável se ele for legal e engraçado, por exemplo. Já a mulher não tem essa permissão em nenhuma circunstância.
Em segundo lugar, na trama a personagem Rosemary (a mulher gorda com quem Jack Black se envolve) é colocada em situações caricatas, quebrando até uma cadeira ao sentar, além de ser vista como totalmente descontrolada na hora de comer.
Infelizmente, isso não é exclusividade de O Amor é Cego. Os personagens gordos em filmes ou séries são, em geral, os fracos, bobos, compulsivos, sem vida sexual e representados de maneira caricata/degradante.
‘Você não sentou no meu kit kat, sentou?’
Em contraponto, a divinização da magreza seqüestra das pessoas qualquer chance de individualidade, nos dizendo que só existe um jeito de ser bonita e aceita: sendo magra (além de branca e heterossexual, claro).
Para resumir: ninguém deixa de ser bonita, saudável ou desejável por ser gorda. Ninguém perde a capacidade de ser esportista, de ir para as baladas, de gostar de salada ou pegar várias pessoas. Está mais do que na hora de rompermos com essa lógica gordofóbica e todos podem ajudar nesse processo!
Então aí vão algumas dicas do bem para melhorar a própria gordofobia.
– Parar de julgar o que amiguinho come.
– Parar de falar coisas como ‘gordice’, como uma associação a coisas gordurosas ou calóricas. Alguém fala ‘vou fazer uma magrice’ quando vai comer salada? Gordos comem coisas calóricas e coisas não calóricas assim como os magros. Essa associação não é produtiva e pode ser muito ofensiva.
– Amigas magras: não falar – ‘nossa, to muito gorda’, pois não é verdade. Se colocar nesse lugar sendo que não sofrem essa opressão na pele é um tanto desrespeitoso. Vocês podem estar mexendo nas feridas das amigas gordas sem perceber.
‘Estou a uma gripe estomacal de distância da minha meta de peso’
Ninguém nasce pronto e estamos sempre sujeitos a ofender os outros, mesmo tomando cuidado. O importante é repensar as atitudes que se tornaram tão naturais para que possamos chegar numa sociedade menos violenta. Chega de gordofobia!
Leia também Gordofobia for Dummies; e Eu Mulher, Definitivamente Não Sou o Que Eu Como.
Caio Borrillo
March 24, 2017 @ 11:18 pm
Como esse filme O Amor É Cego é irritante. Irritante, preconceituoso, mal escrito, mal dirigido. O personagem é um babaca e tem gente que acha o filme uma linda história de amor porque ele é verdadeiramente apaixonado pela gorda. Ou seja, a beleza interior das pessoas é magra, loira, esbelta, tamanho PP! Que babaquice sem tamanho!
Ellie
March 27, 2017 @ 5:09 pm
Uma amiga disse uma coisa que é bem verdade: a pessoa mais fácil de julgar no mundo é um gordo no McDonald’s. Não importa que você esteja lá pelo exato mesmo motivo que ele, se você for magra e ele for gordo, ele está errado e você só está fazendo um lanche.
Bianca
March 30, 2017 @ 8:03 pm
Sempre gosto de ver criticas a esse filme do Jack Black, da pra fazer uma postagem inteira com tudo o que tem de errado com essa ”obra”. Não apenas as mulheres gordas, mas diversos esteriótipos de mulheres ”feias” são expostos no filme. Vivemos essa realidade onde os homens acham que a aprovação é a nossa realização máxima. Me lembro de uma conversa que meu ex teve com um amigo, e esse amigo disse o seguinte sobre a própria namorada ”qualquer um acharia ela feia, mas eu acho ela perfeita cara” como se isso fosse um tremendo elogio e ele fosse o namorado do ano por conseguir ver beleza nela.
Lara Vascouto
March 31, 2017 @ 11:40 am
Esse filme é um terror do início ao fim mesmo. É isso né – o que é mais valorizado na mulher é a beleza, só que o padrão de beleza é praticamente inatingível. Obrigada pelo comentário!
Joyce Maia
April 3, 2017 @ 1:29 am
Tem uma nutricionista, a Paola, que fala muito sobre isso no blog “Não sou exposição”. Recomendo sempre esse blog porque ele mudou a minha vida, sério. =)
Fabiana
September 8, 2017 @ 10:08 am
Já assistiu “madrepérola”, curta produzido em Porto ALegre? Muito interessante, sobre gordofobia.