Gordofobia for Dummies

Pra falar de um tema que não atinge todo mundo, a gente tem que ser didática, né?

gordofobia

Quando falo de padrões de beleza, pressão estética e gordofobia, gosto de ser didática. Nesse texto, resolvi tratar do tema usando exemplos e fotos, pra ficar mais didático ainda. Mas já digo de antemão: certas coisas só vão fazer sentido pra você se você for gorda. Se for magra, “cheinha”, “gordinha”, isso aqui não se aplica à você. Porque mulheres magras, “cheinhas” e “gordinhas” sofrem pressão estética. Mas não gordofobia. O que não significa que esse post foi feito exclusivamente para mulheres gordas. É pra todo mundo (inclusive homens).

E gostaria de fazer uma observação, antes de mais nada. O meu recorte aqui é a gordofobia que mulheres brancas sofrem. Porque eu sou uma mulher gorda e branca, então me reservo a tratar de questões que me afetam (no caso, machismo e gordofobia, apenas).

Entendo que há basicamente 3 padrões de beleza “ideal” na sociedade em que vivemos: modelo, miss e mulherão. Nenhuma surpresa aí. Para usar como exemplo, escolhi 3 das irmãs Kardashian/Jenner.

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Essa é a Kendall, e ela obviamente se encaixa no padrão modelo. Como características a gente pode listar: alta, muito magra, pernas longas, “pouca” bunda e “pouco” peito. Cintura finíssima. Eu a considero linda, de verdade.

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Essa é a Kylie. Ela é o exemplo perfeito do padrão miss, que eu considero estar “entre” os padrões modelo e mulherão. O corpo dela é muito proporcional. Não necessariamente alta, é magra e tem bunda e peito num tamanho ótimo. Nem muito grande, nem muito pequeno. Cintura fina. Proporcionalidade, assim como simetria, são os principais elementos da beleza estética, né? Eu também a acho linda.

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No padrão mulherão, é claro que a gente lembra da Kim, né? Magra, com bundão e peitão. Coxas grossas e torneadas. Cintura não muito fina, mas fina o suficiente pra não dar aquelas dobrinhas. Também é linda, na minha opinião.

Se o seu corpo não se enquadra nesses três exemplos que eu mostrei, isso não significa que você está fora do padrão. O padrão estético não é um patamar estático. É uma faixa, flexível, fluida. Enfim, não são só mulheres magras que estão dentro do padrão estético. Não são só mulheres peitudas e bundudas, tampouco. Vamos olhar mais uns exemplos.

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Essa é a Grace Kelly, musa de vários filmes do Hitchcock. Linda, né? Olha essa cintura!

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Olivia Newton-John, no filme “Grease”. Outra cintura que parece surreal pra mim.

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Duas bondgirls, de filmes mais antigos do James Bond.

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Taylor Swift. Dispensa comentários.

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J-Lo. Rainha, né mores?

Até aqui, só exemplos de mulheres de beleza “ideal”. Agora, vamos aprofundar na problematização:

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Aqui a gente tem dois exemplos de modelo plus-size. A primeira é modelo plus-size sim, não estou contestando. Mas ela não é gorda. Não é fora do padrão. Já a segunda é modelo plus-size também, mas é gorda. É fora do padrão. Porque o plus-size é auto-explicativo, né? São tamanhos maiores. A modelo da primeira foto usa tamanhos de roupas maiores do que as modelos convencionais. Mas ainda é dentro do padrão. Eu a colocaria no padrão “mulherão”, inclusive, o da Kim Kardashian. A modelo da segunda foto é gorda. Mesmo sendo modelo, tenho certeza que sofre gordofobia. Mas pra mim, ela é linda também.

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Na primeira foto, temos a queridíssima Lena Dunham (atriz na série Girls). Na segunda, a glamurosa Beth Ditto (vocalista da banda The Gossip). Lindíssimas. E aqui eu entro numa questão que considero semelhante ao do chamado colorismo. O colorismo é um tipo de discriminação baseada em cor de pele. Quanto mais escura a pele de uma pessoa, mais exclusão ela sofre. E o que eu quero tratar aqui é da gordofobia de acordo com diferentes pesos (no sentido de “mais gorda” e “menos gorda”).

Eu considero que a Lena Dunham ainda está dentro do padrão estético. Ela está ali no limite entre “dentro do padrão” e “fora do padrão”, ok, mas ela não sofre gordofobia da mesma maneira que mulheres como a Beth sofrem. E eu me encaixo no caso da Beth. Atualmente, peso mais de 100kg, e há muito tempo deixei de fazer parte do padrão estético. Minha barriga, meus seios e minha bunda são muito grandes, tenho dobrinhas naturais na cintura, pernas e braços “gordos” e flácidos, estrias e celulites espalhadas pelo corpo inteiro. Estrias na barriga, cintura, seios, celulite na bunda, na perna… Enfim. Mas o que mais me incomoda, no sentido de eu ficar triste toda vez que me olho no espelho, ou numa câmera frontal de celular, ou num reflexo de vidro de carro é a “papada”  que tenho entre o queixo e o pescoço. Sim, meu corpo não tem mais lugar pra armazenar gordura, então armazena até no rosto.

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Essa sou eu. E desde que cheguei no patamar clínico de “obesidade”, venho sofrendo muito com a gordofobia. Chega a ser até engraçado, porque eu consegui perceber como a pressão estética se tornou gordofobia, e como essa  aumentou de acordo com o aumento do meu peso, quase proporcionalmente. Por exemplo, quando eu era magra, as coisas eram de um jeito. Aí engordei uns quilinhos, algumas coisas mudaram. E assim, sucessivamente. Fui ficando cheinha, gordinha, até chegar no patamar gorda (ou obesa). E viver nesse mundo nunca foi tão difícil pra mim.

“Ah, mas você tem que se amar e se aceitar do jeito que é! Beleza não tem padrões! Se você é feliz, isso é o que importa!”

Facílimo falar. Eu me amo, gente. Eu me acho bonita. Eu sou feliz comigo mesma, assim. A batalha interna eu ganho quase todo dia. Mas ao pisar fora de casa, eu perco todas as batalhas externas. Porque a felicidade tem que vir de dentro pra fora, ok, certíssimo. MAS, elementos externos também ajudam, né?

Eu vou me arrumar pra uma festa, me olhar no espelho, me achar poderosíssima, gostosa, diva, deusa, mas quando eu chegar na festa o mundo não vai me olhar com esses olhos.

Entendem? Eu vou continuar entalando na catraca do ônibus (gordofobia institucionalizada). Eu vou continuar não tendo qualquer tipo de representatividade na mídia. As pessoas vão continuar a me encarar quando eu sair de cropped. Os carinhas vão continuar ignorando minha existência na hora de procurar meninas pra ficar nas baladas. Meus amigos hétero vão continuar me enxergando como a “brother”, mas nunca como a “potencial ficante”. Meus crushes vão continuar me vendo como a amiga gorda. As pessoas por quem eu me apaixono vão continuar não correspondendo meus sentimentos.

E aí? Me amar e me aceitar como sou é suficiente?

Texto publicado originalmente em Diários de Uma Mulher Livre

Leia também O Corpo é Resistência: Insurgências Estéticas; e Nunca Fiquei Bem de Biquíni – e o que isso quer dizer sobre mim.

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