“The Big One” – A História Aterrorizante do Terremoto que vai Devastar a Costa Oeste Americana

A história do descobrimento do terremoto que vai causar o maior desastre natural da história dos EUA é quase um episódio de CSI.

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Semana passada, o The New Yorker publicou um artigo de arrepiar até aqueles pêlos pequenininhos dos dedos dos pés. Nele, a jornalista Kathryn Schulz descreveu com maestria hollywoodiana o caos que a região da costa noroeste dos EUA sofrerá quando o temido mega-terremoto conhecido como “the big one” de fato acontecer.

Na verdade, o tal big one que é tão falado se refere ao iminente terremoto decorrente da falha de San Andreas. Schulz, no entanto, fala de um terremoto maior ainda, decorrente da movimentação da falha de Cascadia, que vai do norte de Vancouver e se estende até o norte da Califórnia. Com fontes científicas sólidas, Schulz causou uma pequena onda de pânico principalmente entre os moradores da região de Seattle, que teoricamente sofrerá aniquilação total quando esse terremoto acontecer. Tanto que alguns dias mais tarde, o Reddit organizou uma discussão IAmA com três especialistas renomados de sismologia para responder perguntas de internautas assustados.

Entretanto, quem participou daquela discussão com a esperança de ter seus medos aplacados sofreu uma decepção. É verdade que a promessa de aniquilação total de Schulz foi desmentida. Mas de modo geral, os especialistas acharam o seu artigo bem preciso. É fato que o big one vai acontecer e que já estamos em contagem regressiva para a sua chegada. O problema é que não sabemos se ainda falta 10, 5 ou 1 segundo para o alarme soar. E não ajuda nada o fato de que a região é tão despreparada para esse terremoto, que o único alarme que a população vai ter serão os latidos dos cães alguns segundos antes do tremor.  De acordo com Schulz:

“O tremor do terremoto de Cascadia desencadeará deslizamentos de terra em toda a região – trinta mil deles apenas em Seattle, de acordo com o departamento de gerenciamento de desastres da cidade. Além disso, ele vai também induzir um processo chamado liquefação, quando terra firme começa a se comportar como líquido, para detrimento de qualquer coisa que estiver em cima dela. (…) Em conjunto, os deslizamentos e tremores desencadearão incêndios, enchentes, quebra de encanamentos, destruição de barragens e derramamento de material tóxico. Qualquer um desses desastres de segunda ordem pode ultrapassar o terremoto original em termos de custos, danos e mortes – e um deles definitivamente fará isso. Quatro a seis minutos depois que os cachorros começarem a latir, os tremores vão parar. Pelos próximos minutos, a região vai continuar a desmoronar por conta própria. Então, a onda vai chegar, e a real destruição vai começar.”

Isto é, um tsunami. O que nos leva à história de como os cientistas descobriram que esse terremoto vai acontecer em um futuro muito próximo, que é sobre o que eu realmente quero falar.

A história do descobrimento do terremoto que vai causar o maior desastre natural da história dos EUA é quase um episódio de CSI de tantas provas desconexas que tiveram que ser relacionadas para entender o cenário inteiro. Em primeiro lugar, a aceitação praticamente unânime da teoria das placas tectônicas entre as décadas de 1950 e 1960 criou um grande ponto de interrogação na cabeça dos cientistas. Afinal, a costa oeste americana estava inegavelmente dentro do círculo de fogo do Pacífico – a região que registra a maior atividade sísmica do planeta. Ao longo dos últimos três séculos, toda essa região já havia sofrido pelo menos uma vez com terremotos avassaladores. Só nos últimos sessenta anos, para você ter uma ideia, Japão, Chile, Alasca e Indonésia registraram tremores devastadores, que ficaram entre 9.0 e 9.5 na escala Richter. Enquanto isso, no entanto, a costa oeste americana sempre esteve aparentemente impassível, como se nada de ruim jamais tivesse ocorrido por lá.

Um cientista que ficou bastante intrigado com a falta de atividade sísmica na costa oeste americana foi o geólogo Brian Atwater. Sua investigação começou com a análise das chamadas florestas-fantasma, ao longo dos estados de Oregon e Washington, ao norte da California. Tais florestas, compostas por esqueletos de árvores mortas há muito tempo, também são encontradas no Alasca, na região atingida pelo terremoto de Prince William Sound, de 1964. Nesse evento, parte da floresta perdeu altitude e acabou abaixo do nível do mar. Quando a maré subiu, as árvores foram inundadas por água salgada, o que causou a sua morte.

Imaginando se algo similar poderia ter acontecido nas florestas-fantasma da costa oeste americana, Atwater partiu para uma investigação do solo. A descoberta de camadas de lama e areia não deixou dúvidas: a região não havia sido inundada lentamente ao longo de séculos, conforme todos acreditavam, mas sim afundado subitamente, matando todas as árvores de uma vez só. Junto com o especialista David Yamaguchi, Atwater conduziu um trabalho de análise dos anéis de crescimento das árvores para determinar quando elas pararam de crescer. Com isso, chegaram na data de óbito das florestas: entre agosto de 1699 e maio de 1700.

Certo. Então Atwater e Yamaguchi descobriram que houve, sim, um grande terremoto na região antes de os colonizadores europeus ocuparem a área. O quão grande foi esse terremoto, no entanto, só seria revelado em 1996, quando quatro sismólogos japoneses juntaram essa descoberta com outra peça aparentemente não-relacionada do quebra-cabeça: o tsunami órfão japonês.

A história do tsunami órfão japonês é muito bem documentada. Um belo dia de janeiro de 1700, a costa leste do Japão foi assolada por ondas de mais de 3 metros de altura, sem a ocorrência de qualquer tremor de terra. Há séculos os japoneses já sabiam que deviam correr para as colinas quando a terra tremesse, porque as grandes ondas viriam logo depois. Mas nessa ocasião a terra não tremeu. A causa do tsunami permaneceu um mistério durante três séculos, até que a equipe de sismólogos do japonês Kenji Satake relacionou, em 1996, o terremoto das florestas-fantasma da costa oeste americana com o tsunami órfão na costa leste do Japão.

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Hoje em dia, não há dúvidas a respeito do grande terremoto de 1700. Além de toda a ciência apoiando a descoberta, relatos indígenas da região de repente começaram a fazer sentido. Histórias aterrorizantes passadas de geração para geração, que contam como um dia a terra afundou, o mar recuou, e todos morreram afogados.

Com todos os fatos em mãos e mais um extenso trabalho de análise de material do fundo do mar conduzido pelo cientista Chris Goldfinger, a comunidade científica hoje sabe o suficiente para deixar todo mundo alarmado. De acordo com o histórico de atividade sísmica da falha de Cascadia, um novo grande terremoto na região pode acontecer a qualquer momento.

O grande problema é que os intervalos de atividade sísmica da região são grandes o suficiente para que uma cultura prospere e desapareça ali sem deixar registros úteis para os próximos ocupantes. Com isso, nos últimos 300 anos a região explodiu em números de habitantes e está especialmente vulnerável ao desastre iminente. A esperança, agora, é que os governos regionais tomem medidas para tentar minimizar os danos e conseguir salvar vidas quando o “the big one” chegar. Porque uma coisa é certa: ele vai chegar.


Fontes:

The Really Big One (Kathryn Schulz – The New Yorker)

Orphan Tsunami Gets a Frightning Parent (LiveScience)

Reddit IAmA – We are earthquake experts. Ask us anything about The Really Big One coming for the Pacific Northwest.

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