O Que Fará com que o Racismo Acabe no Brasil?

Mais um caso de racismo no futebol, um técnico (branco) se sentindo injustiçado e a pergunta que não calar: como acabar com o racismo no Brasil?

racismo

Em primeiro lugar, fora Temer.

Em segundo lugar, racismo é crime e há punições para ele previstas em Constituição. Precisamos exigir que elas sejam aplicadas imediatamente. Mesmo assim, em pleno setembro de 2016, o presidente do Grêmio diz que o clube se sente injustiçado.

Explico.

Recentemente, um torcedor do Atlético Paranaense cometeu o crime de racismo (atenuado pela designação de injúria racial) contra um jogador, assim como ocorreu em 2014 por uma torcedora gremista. No entanto, a penalização para o Atlético foi mais branda do que para o Grêmio. Desse modo, o técnico gremista Romildo Bolzan se sente injustiçado, dizendo acreditar que o que ocorreu em 2014 foi um caso isolado e que o fato de o time ter sido punido não acabará com o racismo no Brasil.

Quanto à última afirmativa, ele tem razão. Ser punido individualmente por praticar racismo não irá acabar com o racismo. O racismo no Brasil é estrutural, portanto coletivo, as pessoas nascem nesse sistema em que o negro é sempre vítima de um ódio gratuito.

Crianças negras vão para a escola e são expostas a crianças e adultos racistas. Os pais de crianças negras têm de lidar com inúmeras situações, mas muitos, por não estarem empoderados suficientemente, acabam deixando que seus filhos e/ou filhas passem por humilhações sozinhos/sozinhas. Há que se ter muita energia para gritar contra um sistema que o tempo todo diz que praticar racismo ora é brincadeira ora é fruto da nossa imaginação.

Quando adultos, passamos por situações semelhantes, e muitas vezes tomamos uma posição indulgente, pois o crime de racismo é um crime quase perfeito em que aquele que o pratica não assume a culpa; a sociedade branca legitima sua normalização; e mesmo quando tem a oportunidade de quebrar com essa lógica perversa, ao contrário, se desresponsabiliza ou se desculpa jogando para o outro – no caso, o negro – o peso da violência. Ou seja, na incoerência racista, o negro é quem deve aguentar ser destituído pelo branco de sua humanidade.

Mas então o que fará com que o racismo acabe em nosso país?

Now let’s get in formation

 

Reconhecimento.

A prática do racismo é tão naturalizada que as pessoas brancas não reconhecem ou fazem questão de não reconhecê-la. Mas a premissa do conceito de justiça é que quando alguém faz algo errado, tem de responder por esse ato. É assim que se cria adultos maduros o suficiente para viver em sociedade, para conviver com o diverso. O que o presidente do Grêmio faz é o que todo o branco que pratica racismo costuma fazer: quer ganhar biscoito e fazer o jogo infantil de querer colocar embaixo do tapete a sujeira, deslegitimando quando a justiça recai sobre ele, não dando reconhecimento ao racismo como forma de opressão social de parte significativa da sociedade brasileira e, em menor grau, de seus torcedores negros.

O que precisa ficar evidente nessas situações é que a admissão da responsabilidade gera visibilidade. Aceitar publicamente a punição, nesse caso, poderia ter um caráter educativo para a sociedade. Esse presidente está perdendo uma rica oportunidade de aceitar o erro, carregar o fardo desse racismo (inventado pelos brancos) como time. Admiti-lo é abrir a possibilidade de que o racismo só poderá deixar de ser produzido e reproduzido quando os brancos reconhecerem que são eles a fonte dessa violência, e não aqueles que denunciam.

O presidente do grêmio deveria estar orgulhoso de uma justiça que se impõe sobre o clube de que faz parte, não se sentir injustiçado. Se o Atlético Paranaense teve uma pena mais branda, não significa que não devemos de deixar de nos revoltar.

Temos de pedir, sim, que a justiça seja igual para todos, precisamos sustentar o discurso baseando-nos em que não pode haver para dois pesos duas medidas. Mas é preciso sustentar com base no respeito aos ofendidos e não aos ofensores. E isso passa por assumir o erro. Não devemos nos safar da responsabilidade. A negação de que o racismo aconteceu é, antes de tudo, o cerne do problema e não quem foi mais ou menos punido.

*Postado originalmente em As Tais Cartografias.

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