Mulheres Negras em Hollywood: Falta Oportunidade, não Talento
Os papéis destinados a mulheres negras em Hollywood são poucos, secundários e, muitas vezes, terrivelmente estereotipados.
“Na minha mente eu vejo uma linha. E além dessa linha eu vejo campos verdejantes, e flores adoráveis, e lindas mulheres brancas com seus braços esticados para mim por cima da linha.
Mas eu não consigo atravessar de jeito nenhum. Não consigo atravessar essa linha.”
Quem disse isso foi Harriet Tubman, ativista, abolicionista e sufragista negra americana, no século XIX. A atriz Viola Davis repetiu as palavras de Tubman em seu discurso no Emmy, quando subiu ao palco para se tornar a primeira mulher negra a receber um Emmy como Melhor Atriz de Série Dramática na história da premiação.
Assista ao discurso completo, legendado.
Davis foi a primeira mulher negra a ganhar a maior premiação da televisão americana para a categoria de Melhor Atriz. Halle Berry foi a única mulher negra até hoje a ganhar um Oscar de Melhor Atriz – a maior premiação do cinema americano. Antes que algumas pessoas corram para os comentários para falar que outras já ganharam o Emmy e o Oscar, deixe-me lembrá-los que essas outras (poucas) mulheres negras – entre elas as maravilhosas Uzo Aduba, Lupita Nyong’o e Jennifer Hudson – ganharam seus prêmios como Atrizes Coadjuvantes. E eu faço questão de ressaltar isso porque existe uma diferença fundamental entre os prêmios de Melhor Atriz e Melhor Atriz Coadjuvante.
Isso nos leva a algo muitíssimo importante que Davis disse em seu discurso: “A única coisa que separa mulheres negras de qualquer outra pessoa é oportunidade. Não é possível vencer um Emmy por papéis que simplesmente não estão lá”.
Agora, pare um pouco para pensar quantos filmes e séries de peso você viu recentemente com uma mulher negra no papel principal (quando eu digo “de peso”, quero dizer produções endossadas e catapultadas ao topo por grandes estúdios). Imagino que você vá lembrar de alguns exemplos, mas mesmo se você lembrar de todos, ainda assim será obrigado a reconhecer que eles são muito poucos. Mulheres, em geral, já costumam ser relegadas a papéis secundários com uma frequência de enlouquecer em grandes produções. Mulheres negras, então, têm que se degladiar para conseguir os poucos papéis que Hollywood cria para elas todos os anos.
O grande problema é que, na concepção de Hollywood, uma atriz negra só pode ser escalada para interpretar papéis especificamente escritos para mulheres negras. E existem três problemas sérios com isso.
- Eles são pouquíssimos.
- Em 99% das vezes eles são secundários.
- Na maioria dos casos eles são terrivelmente estereotipados.
Esses papéis não faltam pra elas: a Escrava, a Empregada, a Barraqueira e a Melhor Amiga Arretada.
Mulheres negras simplesmente não disputam os mesmos papéis que as mulheres brancas. E os papéis que elas disputam são limitadíssimos e quase nunca dão oportunidade de mulheres negras se destacarem como grandes atrizes.
E é por isso que Davis agradeceu, em seu discurso, profissionais cujo papel tem sido fundamental para mudar essa realidade terrivelmente restritiva para atrizes negras. Executivos, produtores e roteiristas que largaram mão dessa mania de se ater ao “perfil racial” inicialmente imaginado para determinado personagem na hora de contratar o ator que vai interpretá-lo.
Shonda Rhimes, por exemplo, não deu sobrenome a nenhum de seus personagens de Grey’s Anatomy inicialmente, para evitar que a diretora de elenco se prendesse a características físicas na hora de contratar os atores. Foi assim que Chandra Wilson, uma mulher negra, acabou disputando o papel de Miranda Bailey com a loiríssima Kristin Chenoweth.
De acordo com Linda Lowy, diretora de elenco da série, quando Wilson conseguiu o papel foi como se o universo se abrisse de repente para novas e incríveis possibilidades.
Além de Grey’s Anatomy, Rhimes também é criadora, roteirista e produtora de Private Practice e Scandal; e assumiu o cargo de produtora-executiva de How to Get Away with Murder – série criada por Peter Nowalk, pela qual Viola Davis ganhou o Emmy. Nesse caso, também, o papel assumido por Davis não havia sido escrito para uma mulher negra, mas felizmente isso não impediu que ele fosse preenchido por uma. Em outras ocasiões Davis já reclamou da falta de diversidade em Hollywood e chegou a agradecer os produtores de How to Get Away with Murder por pensar que “uma mulher misteriosa poderia ser uma mulher negra de 49 anos com a minha aparência”.
Sinceramente, Hollywood, não é pra ser tão difícil assim.
Leia também sobre os estereótipos racistas que Hollywood precisa parar de usar.
Juba
September 22, 2015 @ 2:52 pm
pequenas mudanças que fazem muita, muita diferença, enquanto a equidade não chega 🙂
Lara Vascouto
October 3, 2015 @ 3:13 pm
Sim! Obrigada pelo comentário, Juliana! 🙂
Izadora
November 11, 2015 @ 2:38 pm
Sou suspeita para falar sobre o trabalho de Shonda porque ele é incrível apenas pelo fato de me fazer sentir representada. Tive o prazer de assistir o Emmy ao vivo e me emocionar com o discurso de Viola Davis, mas a melhor parte é que a cada episódio que assisto de HTGAWM ela me dá um abraço cada vez mais acolhedor.
Parabéns pelo post, beijo.
Lara Vascouto
November 11, 2015 @ 4:32 pm
Shonda arrasa muito, Izadora! <3 Obrigada pelo comentário!
Jonathan
August 31, 2018 @ 1:36 am
sabe acho que existe um outro fator que também faz com que não existam personagens de outra entintas, principalmente negros em papeis de protagonismo com personagens mais complexo e com mais camadas de personalidade, e o fato de que ao escrever uma historia com um protagonista branco, não e necessário colocar em pauta o racismo ou opressão como fator que define a personalidade do personagem, ao passo que quando o personagem é negro, fica meio “destonado” com a realidade simplesmente não explora esse fator, não que isso não seja algo pouco importante ou desnecessário de ser explorado a fim de trazer uma discussão sobre a sociedade e seus preconceitos, mas um personagem branco simplesmente não tem o racimo como tópico no momento que se elabora e se faz a construção de roteiro mais complexo.
por exemplo: pegue um filme qualquer com um personagem branco como protagonista e coloque um atro negro no lugar, inicialmente não modificara em nada a historia afinal a cor do protagonista não é um fator determinante para o desenrolar da trama, mais colocar um personagem negro em um filme onde ninguém tem atitudes racistas, onde ninguém tenta ofende-lo ou discrimina-lo pela sua cor ou onde ninguém faz cometários sobre isso, apesar de não agregar em nada no desenrolar da historia como fator que adiciona a trama, fica meio estranho pois sabemos que na vida real as pessoas são preconceituosas e produzir um filme aonde o racismo e preconceito não aparecem nem como alegoria da sociedade ali retratada, acaba dando uma sensação de que o filme não esta sendo coerente com a realidade, como se quisesse se retira da discussão do tema no eventos retratos o ali.
claro existe filmes como 7 homens e destino onde o personagem negro Crisholm (Denzel Washington) não tem a discussão do racismo como como foça motriz do personagem uma vez que o evento, a retalhação do empresario ganancioso e o recrutamento de outros heróis e a preparação para o conflito tomam a historia como foco da narrativa.
Acho que isso acaba tendo um peso na hora de escreve um roteiro com um personagem negro, já que o assunto ainda e tido como um tabu que não pode de discutido abertamente sem fica a todo o momento se auto policiando para não dizer algo errado. mais isso e apenas uma observação sobre filmes e personagens, posso esta completamente equivocado em tudo o que disse aqui.