6 Artistas Não-Brancas que se Tornaram ‘Brancas’ em Prol de Suas Carreiras

Na indústria do entretenimento, a regra é clara: quanto menos “étnico” – ou seja, quanto mais branco – maiores as chances de um artista se destacar. 

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Há pouco mais de um mês, a rapper americana Lil’ Kim (acima) chocou os fãs ao postar fotos de seu mais novo visual no Instagram. E não é para menos: de negra, Lil’ Kim passou para loira de pele clara.

Essa não é a primeira vez que a aparência da rapper vira notícia. Nos últimos quinze anos, ela passou por uma série de cirurgias plásticas que foram aos poucos apagando seus traços naturais e transformando sua aparência. Em uma entrevista do ano 2000 para a revista Newsweek, Lil’ Kim nos deu um vislumbre do que está por trás de intervenções físicas tão intensas. Depois de comentar sobre a reprovação que sofria do pai quando criança e de homens diversos ao longo da vida (“Sempre foi homens me colocando para baixo, igualzinho meu pai. Até hoje, quando alguém diz que sou bonita, eu não consigo ver.”) ela acrescentou:

“Tenho baixa autoestima, sempre tive. Os homens sempre me traíram com mulheres de aparência européia. Sabe, do tipo de cabelos longos. Mulheres muito lindas que me deixavam pensando, ‘como posso competir com isso?’. Ser uma garota negra normal não era bom o suficiente.”

Poderia ser a história de qualquer mulher, dada a cobrança que todas sofremos para alcançar um padrão de beleza inalcançável, mas as especificidades da transformação de Lil’ Kim mostram que o seu caso é consequência da dupla opressão que atinge as mulheres negras: o machismo e o racismo.

É impossível ignorar que o padrão de beleza a que somos todas pressionadas a aderir é, acima de tudo, branco. O ônus das pressões estéticas para mulheres negras é muito maior. De acordo com a blogueira Mara Gomes:

“O corpo considerado perfeito é magro e também branco, quanto mais claro mais bonito, mais aceitável. O fato de esse corpo feminino ser considerado belo por ser claro confronta diretamente a construção da autoestima de uma mulher negra. Por não se ver como alguém socialmente quisto na televisão, nas revistas, na literatura e não esquecendo-se também na história, a mulher negra é um ser colocado a parte da junção do que é belo. Se existe a divisão entre o gordo e o magro, existe a separação entre negro e branco.”

Essa divisão é clara na forma como nos referimos à estética negra. O cabelo crespo é “cabelo ruim”, o nariz mais largo é “nariz achatado”, e a implicação por trás da frase recorrente “você é uma negra bonita” é clara como a luz do dia – “você é bonita, apesar de ser negra”.

Além do racismo, o que vemos na transformação de Lil’ Kim é resultado também do colorismo. Resumidamente, o colorismo é a discriminação que faz com que quanto mais escura a pele de uma pessoa, e quanto mais traços negros ela tenha (cabelo crespo, nariz largo), mais exclusão ela sofra. Com isso, muitas mulheres negras aderem a práticas que as ajudam a “camuflar” seus traços naturais (como alisamentos capilares, por exemplo) para sofrer menos discriminação. De acordo com a blogueira Aline Djokic:

“O colorismo funciona como um sistema de favores, no qual a branquitude permite a presença de sujeitos negros com identificação maior de traços físicos mais próximos do europeu, mas não os eleva ao mesmo patamar dos brancos; (…) É importante salientar que aceitar esse “favor” não é uma opção para o sujeito negro. Rejeitar esse “acordo” acarretaria na sua exclusão. Um exemplo é o de mulheres negras de pele clara que, enquanto alisavam os cabelos, sofriam menor perseguição racial no local de trabalho, mas que depois de abdicarem desse processo passaram a ser discriminadas abertamente. O que acontece é que a negritude dessas mulheres não podia mais ser ignorada e a reafirmação dela através da estética negra passou a ser vista pela branquitude como uma ameaça, um sinal de insubordinação, que merecia retaliação e ou exclusão. No caso de mulheres de pele escura, o abandono da estética branca pode significar a intensificação da exclusão social, da qual ela já vem sendo vítima ininterruptamente e em todos os espaços.”

Aproveito para fazer uma pausa aqui e falar que se você é do tipo que gosta de argumentar contra o conceito de apropriação cultural afirmando que as mulheres negras que alisam o cabelo estão praticando-a contra os brancos, por favor, leia a fala acima pelo menos mais umas dez vezes e pare, apenas pare.


Sério, mano, pára.

 

Uma das formas através da qual o padrão de beleza branco é reforçado é pela mídia. Na televisão, no cinema, nas novelas, em revistas, videogames e até na literatura temos o reforço desse ideal da estética branca européia como bela, e da negra como feia – ou, na melhor das hipóteses, como exótica ou hipersexualizada. Seja como for, o efeito desumanizador é o mesmo. E para piorar, como na nossa cultura o belo é associado ao bom, consequentemente vemos isso reforçado também nas telas, tanto com uma quantidade significativa de vilões negros e de outras etnias, como com uma ausência generalizada de heróis protagonistas fora do padrão branco europeu.

brancasAté em histórias baseadas em fatos reais em que o personagem central não é branco, vemos atores brancos escalados para interpretá-lo.

 

Obviamente que isso é péssimo não só para o público não-branco de forma geral, como também para os próprios artistas não-brancos, que encontram uma dificuldade enorme tanto para engrenar a carreira, como para serem reconhecidos depois que ela finalmente deslanchou (coisa que, pelo segundo ano consecutivo, a premiação do Oscar nos mostrou). No caso da indústria do entretenimento, o colorismo é escancarado: quanto menos “étnico” – ou seja, quanto mais branco – maiores as chances de um artista se destacar. Como bem refletiu a blogueira Joice Berth: “Será que é coincidência que a santíssima trindade do pop internacional [Nicki Minaj, Beyoncé e Rihanna] seja formada por negras de pele clara e características europeizadas?”

Por esse motivo, não surpreende que alguns desses artistas optem por tomar medidas para apagar seus traços físicos naturais em busca de uma estética branca que lhes garanta aceitação e que poderá facilitar o desenvolvimento de suas carreiras. Que isso aconteça deve servir para nos fazer refletir e identificar em nossas próprias ações, falas e julgamentos como ajudamos a manter a inferiorização da estética não-branca no nosso cotidiano e o que podemos fazer para mudar esse cenário. Menos choque e mais desconstrução (principalmente auto-desconstrução) são essenciais.

Jennifer Lopez, Beyoncé, Rihanna, Nicki Minaj – não há confirmação de nenhuma delas, mas muitos acreditam que todas já tenham feito algum clareamento de pele e/ou cirurgia plástica ao longo da carreira. Quanto a alguns outros artistas, não há dúvidas sobre as intervenções. Artistas como…

Merle Oberon

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Merle Oberon foi uma famosa atriz britânica das décadas de 1930 e 1940. Determinada a esconder suas origens (a atriz nasceu em Bombaim, Índia), ela clareou a pele, afirmou ter nascido na Austrália e passou anos escondendo sua mãe indiana do público, chegando ao ponto de pedir que sua pele fosse clareada em fotos antes de expô-las em sua casa. Mais tarde, a atriz sofreu com alergias e danos na pele devido aos tratamentos para clareá-la.

Cindy Margolis

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A atriz e modelo Cindy Margolis fez cirurgias no nariz, olhos e bochechas para atenuar seus traços judeus e aumentar a sua visibilidade em Hollywood.

Dencia

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A cantora nigeriana Dencia clareou a pele com um produto de sua própria de sua própria marca: o Whitenicious. A cantora causou polêmica ao defender o seu produto afirmando que “branco significa pureza”. Às críticas, ela responde: “Podem dizer a bobagem que quiserem sobre a Beyoncé, Nicki Minaj ou Rihanna, mas sabem do que mais? Estão no topo, são campeãs, e todas clarearam a pele”.

Lindsay Price

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A atriz Lindsay Price, de ascendência coreana, fez cirurgias no queixo e nos olhos, para deixá-los mais “ocidentais”. Com isso, a atriz conseguiu papéis mais diversos, não limitados a asiáticos.  

Vera Sidika

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A modelo queniana Vera Sidika anunciou que fez tratamento de branqueamento de pele, afirmando: “Fico surpresa com a hipocrisia com a qual os homens fingem que gostam das mulheres negras quando na verdade sempre vão atrás das brancas”. Assim como Dencia, Sidika rebate às críticas: “Nunca criticaram a Rihanna e a Nicki Minaj (quando clarearam a pele), e a mim sim?”.

Rita Hayworth

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No começo da carreira, a atriz americana Rita Hayworth (nascida Margarita Carmen Cansino), foi aconselhada a clarear a pele, fazer eletrólise na linha capilar (basicamente, depilação a laser na testa), tingir os cabelos, e mudar de nome para atenuar suas características latinas.  

Abaixo você encontra alguns links importantes para se aprofundar no assunto:

Leia também no Nó de Oito: 10 Vezes que Atores Brancos Interpretaram Personagens de Outras Etnias (nos últimos dez anos); Mulheres Negras em Hollywood: Falta Oportunidade, não Talento; e Personagens Não-Brancos em Filmes de Fantasia – Vilões, Monstros ou Figurantes

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