A Samurai e o Protagonismo Feminino nos Quadrinhos
Ilustrada por oito artistas diferentes, A Samurai traz uma protagonista guerreira livre das rotineiras objetificações a que são submetidas personagens femininas em quadrinhos.
“Japão, meados do período Edo. O país era governado pelos daimyos (senhores feudais) que eram defendidos por fiéis samurais. Nesse contexto, as mulheres eram seres submissos que aceitavam serem tratadas como inferiores sem poder questionar. Exceto Michiko. Ainda recém-nascida, ela foi deixada no okiya, a casa das gueixas, para ser doutrinada como uma delas, mas, mesmo parecendo ter aceitado sua condição, ela alimenta o desejo de encontrar sua família e viver uma vida normal. Para tanto, Michiko decide mudar o seu destino e se torna uma samurai que não mede esforços para atingir seus objetivos e lutará até o fim para realizar os seus sonhos.”
Não tem nada mais prazeroso do que escrever sobre algo que você gosta. Dessa forma começo a minha resenha sobre essa HQ maravilhosa que li recentemente.
A Samurai é um projeto financiado pelo Catarse em junho de 2015. O primeiro lançamento da HQ ocorreu no FIQ em Belo Belo Horizonte, que aconteceu entre 11 a 15 de novembro do ano passado. Em seguida, no Tributo a Claudio Seto. E, mais recentemente, ela também esteve disponível no último evento da CCXP (Comic Con Experience).
“A ideia de fazer um roteiro para HQ me parecia longínqua, como um terreno no qual eu nunca poderia pisar. No entanto, algo brotou dentro de mim enquanto eu andava pelos corredores do Artists Alley durante a CCXP. Ao ver tantos artistas talentosos reunidos, pensei: por que não escrever e chamar um punhado deles para desenhar? E bem, foi o que fiz.” – Mylle Silva
A roteirista Mylle Silva conta que desde o início da criação do projeto teve um objetivo específico: dividir a história em oito partes, sendo que cada uma seria ilustrada por um quadrinista escolhido por ela – sua própria “dream team”. E todos os oito artistas aceitaram de imediato.
Os quadrinistas participantes são: Yoshi Itice, Vencys Lao, Guilherme Match, Mika Takahashi, Bianca Pinheiro, Herbert Berbert Leonardo Maciel e Gustavo Borges.
“Cada artista colocou um pouco de si na história, pois deixei todos livres para fazer melhorias na narrativa. Por isso, eu não sou a única autora aqui, apenas plantei uma semente. Espero que você tenha gostado dos frutos que colhemos – incompletos, impermanentes e imperfeitos, mas muito saborosos”. (Trecho dos Extras de “A Samurai” por Mylle Silva)
O que mais me chamou atenção em A Samurai foi o uso das cores. Cada artista escolheu uma cor específica para contar sua parte da história. No primeiro capítulo, chamado “A Gueixa”, temos a predominância do rosa, que faz com que tenhamos a sensação de estarmos cercados de cerejeiras enquanto lemos. Em um momento em que ocorre uma batalha na floresta, temos a predominância da cor verde, em uma associação com a vegetação local. No período de raiva da protagonista Michiko, há um capítulo com a predominância do vermelho. Cada artista soube associar positivamente a construção do ambiente com o momento vivenciado pela protagonista.
A protagonista Michiko é uma mulher que ignora o destino imposto pela sociedade machista de sua época e resolve lutar por suas escolhas independentes, não medindo esforços para alcançar seu objetivo: encontrar sua família.
Gostei muito da forma como a protagonista foi construída. Nenhum artista objetificou a Michiko, construindo uma guerreira humana, com roupas normais e confortáveis para suas batalhas, fugindo dos estereótipos que buscam objetificar o protagonismo feminino nos quadrinhos para o público masculino.
“Tenho verdadeira paixão por mulheres guerreiras, com espírito forte e que lutam por seus ideais, sou fã da Xena, da Hikari (Guerreiras Mágicas de Rayearth), da Kitana (Mortal Kombat), da Lara Croft, da Lightining (Final Fantasy XIII), da Catherine (Morro dos Ventos Uivantes) e de tantas outras personagens que me ensinaram o verdadeiro significado de lutar pelos próprios sonhos. E a Samurai é minha singela homenagem a todas elas.” –Mylle Silva
Não pude deixar de notar a semelhança da protagonista Michiko, no capítulo “A Memória” – desenhado por Mika Takahashi – com a protagonista da animação da Ghibli “The Tale of the Princess Kaguya”, cujos traços são marcantes e semelhantes.
The Tale of the Princess Kaguya
A Samurai
Outra surpresa que eu amei foi a Galeria de Ilustrações, com artistas convidados ilustrando a Michiko. Vou deixar um trecho de cada desenho, que podem ser encontrados completos na HQ.
Da esquerda para a direita, por ordem de aparição: Marcio R. Gotland – Fefê Torquato – Digo Freitas – Nicolas Cares – Samanta Hit (Fonte: Manjericcão)
A Samurai traz uma mensagem forte sobre a importância de lutar pelo que se acredita, independente dos obstáculos impostos pela sociedade. Tudo acompanhado pelo primoroso roteiro da Mylle Silva e pelos belíssimos traços de cada artista – além da grande surpresa na narrativa final, que somente quem ler descobrirá.
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Texto postado originalmente aqui.
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